quarta-feira, 14 de abril de 2010

A Teia de Aranha VI






A aranha está bocejando e se espreguiçando na varanda da teia. Já são 15 pra meio dia. Foi cansativa a noite da aracnídea. Nisso despenca do ar um mosquitão de asas vermelhas bem em cima dela e derruba-a sobre aqueles fios mais resistentes do que o aço. A aranha sem poder respirar direito contempla um sorriso maroto e um olhar malicioso na face do mosquito invasor, que já vai arrancando as asas e despindo a aranha do seu casaco de pelos e... Passada uma hora o mosquito vai-se embora satisfeito.

No outro dia a mesma coisa. Só um pouco mais cedo. Dez pra as nove. A aranha está tomando o seu desjejum na mesa da copa - omelete de larvas de mosquitos - quando é surpreendida pelo mosquito de asas vermelhas que já vai mostrando a meia e a cinta liga e...

No fim da semana, a aranha está exausta e enfarada do mosquito de asas vermelhas. Pensa em se mudar temendo um novo ataque. Antes, porém, procura um terapeuta cognitivo-comportamental, o medidor de pau. Esse aí da foto.

-Seu medidor de pau vim queixar do mosquito de asas vermelhas. Eu desenvolvi uma fobia ao mosquito de asas vermelhas nos últimos dias. Sabe como são estes mosquitos de asas vermelhas... Tenho que ficar encerrada dentro da teia de medo. Com as portas fechadas, inclusive, se não ele vai entrando e... E agora seu medidor de pau? Haverá solução para mim a não ser sumir do mapa?

A aranha entrou num processo de exposição gradual e dessenssibilização ao mosquito de asas vermelhas. Primeiro teve que pegar a foto do mosquito de asas vermelhas na mão e contemplá-la sem desviar o olhar. Ficou taquicárdica. Suava tremendamente. Sentiu as patas fraquejarem, e por fim desmaiou.

Doutra vez, foi obrigada pelo medidor de pau a segurar um vidro com tampa dentro do qual estava o mosquito de asas vermelhas. Os dois se fitaram nos olhos. Rolou um deja vu. O mosquito de asas vermelhas ficou afoito. Tentou sair do vidro, forçou a tampa, mas, felizmente para a aranha, não conseguiu. Pôs-se a dançar. E cantarolar:

-It´s now or never, come hold me tight iiiii, please be my darling be my tonight. A aranha não pode suportar outra vez. Sucumbiu antes que o mosquito de asas vermelhas cantasse "Tomorrow will be to late". Porém, semi-acordada, ouviu-o guinchar "It´s now or never, my loooooooove won´t wait".

Aos olhos da aranha a terapia só a estava deixando ainda mais traumatizada. No entanto, como não havia outra esperança, decidiu prosseguir com ela. No terceiro encontro com o medidor de pau, este o levou para jantar e, chegando ao restaurante, quem estava lá? O mosquito de asas vermelhas. Era convidado do medidor. Ficou só puxando conversa com a aranha, já ia marcar um encontro com ela, quando foi interrompido por um pisão no pé. Conteve-se dali para a frente. Ficou na dele. Só então a aranha voltou a respirar, porque estivera com a respiração suspensa desde o início do jantar.

Na quarta sessão a aranha foi incentivada a pegar um cineminha com o mosquito de asas vermelhas. Não queria, mas não tinha saída. Iria, a contragosto, desde que o medidor de pau também fosse e ficasse escondido em algum canto da sala de cinema, de olho no mosquito de asas vermelhas.

Romeu e Julieta. A aranha se esgueirou para o canto da cadeira oposto ao do mosquito. No meio do filme - naquela cena em que o Leonardo di Caprio se ajoelha e chora convulsivamente - o mosquito tencionou avançar na aranha e, como era de se imaginar, foi interrompido - graças para a aranha - a tempo pelo medidor de pau, que saiu de alguma brecha invisível e sentou-se entre os dois.

NO final da sessão, o mosquito estava chorando e enxugando as lágrimas nas asas vermelhas. Prometeu à aranha que nunca mais iria pular em cima dela e que iria trocar as asas vermelhas por outras brancas e que se transformaria em um mosquito diferente, um mosquito em busca do amor.

A aranha foi embora satisfeita, crendo ter feito um bom negócio com aquele medidor de pau. Já ia longe, quando movida por uma curiosidade irreprimível virou-se para trás e a tempo de ver o medidor de pau estendendo uma nota de cinquenta reais para o mosquito de asas vermelhas.

Ato derradeiro:
A aranha volta correndo e grita: - Eu quero meu dinheiro de volta!
O medidor de pau responde: - Agora já era. Aranha mão de vaca!

A aranha vai-se embora. Está curada.


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